Caçada a quadrilha de mega-assaltos dura 25 dias e já tem 15 mortos; bandidos usam rios para fuga
Cerca de 350 policiais de cinco Estados estão mobilizados em uma das maiores caçadas a criminosos já realizadas no País.
A força-tarefa persegue, com apoio de três helicópteros, barcos, drones e 120 viaturas, a quadrilha que levou terror à cidade de Confresa (MT), no dia 10 de abril, ao incendiar um quartel da PM e explodir carros e a sede de uma empresa de valores.
Conforme a Polícia Civil de Tocantins, a maior parte dos integrantes da quadrilha é de São Paulo.
Até a tarde desta quinta-feira, 4, no 25º dia da Operação Canguçu, 15 suspeitos foram mortos em confronto com a polícia e cinco foram presos – três deles não participaram diretamente do ataque. Outros ainda são procurados. No início da tarde, suspeitos estavam cercados em uma mata, em Marianópolis (TO).
A força-tarefa já cobriu uma área superior a 10 mil km², equivalente à metade do território de Sergipe. Além das polícias de Mato Grosso, ela é composta por policiais de Tocantins, Goiás, Pará e Minas Gerais. As buscas começaram em Mato Grosso e se estenderam ao oeste de Tocantins e sudeste do Pará, seguindo a fuga do bando.
Entre os policiais, estão especialistas no combate ao crime na modalidade “domínio de cidades”, que já deixou para trás o chamado novo cangaço.
São ações de quadrilhas com alto poder de destruição que levam terror a populações inteiras, como aconteceu em Confresa.
Durante quase um mês de buscas e confrontos, os policiais apreenderam 11 fuzis AK-47, dois fuzis calibre 50 capazes de abater aeronaves, granadas, carregadores, milhares de munições, capacetes e coletes balísticos e até balaclavas, espécie de capuz resistente.
Nesta quinta, a Polícia Civil do Mato Grosso anunciou a prisão do principal responsável pela logística da quadrilha, um homem de 30 anos.
Segundo a investigação, ele alugou os dois imóveis em Redenção, no Pará, de onde os criminosos saíram em oito carros – entre eles cinco veículos de luxo – para o ataque em Confresa, no estado vizinho.
A logística incluía barcos para a fuga dos bandidos pelos rios da região e até um helicóptero, que não chegou a ser usado.
Conforme a Polícia, também foram presos dois suspeitos de terem dado apoio aos criminosos, sem participação direta no ataque.
No total, foram registrados 11 enfrentamentos entre policiais e bandidos, com baixas apenas no lado dos criminosos.
Os últimos confrontos aconteceram na terça-feira, 2, em Marianópolis, com dois suspeitos mortos.
No dia anterior, quatro tinham sido mortos em trocas de tiros na mesma região, no sudoeste da Rondônia.
Os tiroteios e a intensa mobilização policial levaram três cidades a decretarem situação de emergência.
Também nesta quinta-feira, a Secretaria de Segurança Pública de Tocantins informou que nove integrantes da quadrilha –
sete mortos e dois presos – são oriundos de São Paulo.
Dois são do Maranhão e outros três, de Pernambuco, Goiás e Pará, respectivamente.
Três ainda não tiveram a origem identificada.
Um dos fuzis apreendidos com os suspeitos tinha o brasão da PM de São Paulo e havia sido furtado na capital paulista.
O delegado titular da Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCO) da Polícia Civil, Gustavo Belão, disse que um homem preso em Redenção (PA) planejou o assalto e convocou para a ação criminosos de outros Estados.
“Ele é o principal articulador da quadrilha e alugou diretamente uma das casas usadas pelo bando durante os preparativos para o ataque. Durante a investigação descobrimos que ele tinha fugido para Araguaina (TO) e efetuamos sua prisão. É o mais importante apoio logístico do grupo”, disse. Ele e outros dois homens presos também atuaram para conseguir os veículos blindados usados no assalto, entre eles um Land Rover Sport, uma Hillux SW4 e um Dodge Durango.
Entenda a cronologia da operação
9 de abril
Era um domingo quando ao menos 20 criminosos armados com fuzis invadiram o quartel da Polícia Militar em Confresa, renderam os policiais e atearam fogo ao prédio. Durante a invasão, eles explodiram um carro na entrada da unidade, causando pânico entre os 22 mil habitantes da cidade. Outra parte do grupo atacou o prédio da empresa de valores Brinks, explodindo as paredes do edifício. O bando espalhou explosivos pela cidade e baleou uma pessoa, que sobreviveu.
Na fuga, os criminosos seguiram em veículos blindados até Santa Terezinha, ainda em Mato Grosso, depois usaram barcos para fugir pelo Rio Araguaia e adentrar o Estado de Tocantins. As embarcações foram afundadas para não deixar rastros. No dia seguinte, atendendo a pedido do governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (União), policiais de outros Estados se juntaram à caçada.
10 de abril
Os primeiros confrontos entre as forças policiais e a quadrilha aconteceram no município de Pium, em Tocantins, e deixaram a população em pânico. Divididos em dois grupos fortemente armados, os bandidos fizeram a polícia recuar após a munição acabar. Com a chegada de reforços, os policiais voltaram a fechar o cerco e houve novos tiroteios em que um bandido morreu e um suspeito foi preso.
Uma família foi feita refém e veículos foram roubados em propriedades rurais. As ações aconteceram próximo ao Centro de Pesquisa Canguçu, da Universidade Federal do Tocantins (UFT), daí o nome da operação. Turistas estrangeiros e funcionários foram retirados da unidade pela polícia. Devido aos tiroteios, a prefeitura de Pium decretou situação de emergência, medida inédita no estado.
11 de abril
Com a chegada de policiais de Goiás e do Pará, a caçada aos criminosos se intensificou. De uma base montada em uma fazenda, aeronaves e embarcações passaram a fazer uma grande varredura na região, encurralando suspeitos na zona rural da Marianópolis. Um deles, de 28 anos, foi morto a tiros. No dia seguinte, chegaram duas aeronaves e 14 militares da força de elite da PM de Minas Gerais, reforçando a caçada aos criminosos na Ilha do Bananal.
15 de abril
Nova troca de tiros aconteceu na divisa de Tocantins com o Pará. Os suspeitos atiraram contra um helicóptero, mas ninguém foi atingido. A prefeitura de Araguacema (TO) suspendeu as aulas.
17 de abril
A prefeitura de Marianópolis publicou decreto suspendendo as aulas, o atendimento médico e o transporte de moradores da zona rural, devido à presença da quadrilha na região. Na área de confronto, foram encontradas fuzis calibre 50 e granadas.
19 de abril
Em outro confronto, quatro suspeitos morreram em cerco à sede da fazenda Vale Verde, invadida pelos bandidos. Também foram apreendidos quatro fuzis. Os tiroteios levaram à instalação de um posto médico no centro das operações para dar socorro emergencial. Equipes de saúde que atendiam moradores ganharam escolta.
23 a 27 de abril
Houve novos tiroteios em que três suspeitos foram mortos. Uma viatura da PM de Tocantins que participava do cerco aos criminosos capotou, deixando quatro policiais feridos, um deles em estado grave – ele ainda está internado.
28 de abril
Os governadores de Mato Grosso, Mauro Mendes (União), Goiás, Ronaldo Caiado (União) e Tocantins, Wanderlei Barbosa (Republicanos) visitaram o centro de operações e se reuniram com os policiais da força-tarefa.
29 de abril
Mais um suspeito foi morto a tiros em uma fazenda no município de Caseara. Ele estava com um fuzil.
1 de maio
De manhã, em confronto com policiais, em Marianópolis, dois suspeitos foram alvejados e levados a um hospital, mas não resistiram. Na tarde do mesmo dia, em novo confronto, outro suspeito foi morto.
2 de maio
Equipes policiais localizaram e entraram em confronto com dois suspeitos que foram atingidos, socorridos, mas não resistiram aos ferimentos, morrendo no hospital. Um deles tinha os pés enrolados com fibras sintéticas para não deixar rastros no solo. O outro suspeito morto era um jovem morador de Marabá (PA) que, segundo os familiares, estava desaparecido desde o dia 9 de abril. A família chegou informar o desaparecimento à polícia e divulgar sua foto em redes sociais na tentativa de encontrá-lo, sem saber que o rapaz saíra de casa para participar do assalto em Confresa.
Relembre outros mega-assaltos
Outros assaltos recentes mobilizaram grandes aparatos policiais em caçadas a quadrilhas especializadas. Veja.
Mega-assalto em Guarapuava: Na noite de 17 de abril de 2022, criminosos incendiaram caminhões em uma rodovia e explodiram a sede de uma empresa de valores, em Guarapuava, no Paraná. Os bandidos atacaram também um batalhão da Polícia Militar, ferindo dois policiais. Moradores foram usados como escudos humanos. A força-tarefa de caça aos criminosos mobilizou mais de 180 policiais. Ao menos 17 suspeitos foram presos.
Mega-assalto em Araçatuba: No dia 30 de agosto de 2021, três agências bancárias foram atacadas com explosivos, no interior de São Paulo. A quadrilha fez reféns espalhou bombas pela cidade. Ao menos 20 criminosos participaram da ação que resultou em três mortes, uma delas de um suspeito, e cinco feridos. A ação, caracterizada como “novo cangaço”, mobilizou mais de 350 policiais e dois helicópteros na caçada aos criminosos.
Mega-assalto em Criciúma: No dia 31 de novembro de 2020, cerca de 30 homens com armas potentes em dez veículos de luxo cercaram a área central da cidade de Criciúma, em Santa Catarina, incendiaram carros para bloquear os acessos e atacaram uma agência do Banco do Brasil. Além de fazer reféns, os criminosos balearam um policial. A caçada mobilizou mais de 100 policiais e se estendeu ao norte do Rio Grande do Sul e ao interior de São Paulo. Dez pessoas foram presas. Os criminosos teriam levado R$ 125 milhões, em um dos maiores assaltos a bancos do País.
História por José Maria Tomazela