DF também está sujeito a desastres ambientais: como governo e Legislativo se preparam?
Recursos que mais se aproximam da prevenção de tragédias destinados pelos distritais abrangem urbanização e infraestrutura — como drenagem pluvial — e limpeza de lixo
O tema ambiental ganhou destaque no país após a situação de calamidade vivenciada pelo Rio Grande do Sul, onde as enchentes impactaram 473 municípios e causaram ao menos 169 mortes. Especialistas alertam que o Distrito Federal já sofre com as mudanças climáticas, e a prevenção deve estar na agenda do poder público, bem como o controle do uso do solo.
Ao Correio, o professor de ciências biológicas do Centro Universitário de Brasília (Ceub) Fabrício Escarlate pontua que uma das consequências das alterações do clima é a intensificação dos extremos meteorológicos. “Isso significa que as chuvas se tornarão mais intensas nos períodos chuvosos e as secas, mais severas nos períodos secos. Em resumo, os extremos climáticos tendem a se tornar cada vez mais pronunciados, resultando em temperaturas mais altas ou mais baixas e índices pluviométricos mais elevados ou mais reduzidos”, afirma o especialista.
“Nos últimos anos, o volume de chuvas aumentou no Distrito Federal. No fim de 2023 e início deste ano, testemunhamos salas e laboratórios da UnB inundados, várias quadras e tesourinhas submersas. Esse aumento no volume de chuvas é um reflexo das mudanças climáticas que têm ocorrido gradualmente ao longo dos anos. A ampliação desses extremos climáticos nos coloca em situação de vulnerabilidade, independentemente das medidas que sejam tomadas a curto ou médio prazo. Estamos vulneráveis simplesmente pelo fato de os extremos se tornarem mais intensos”, emenda Fabrício.
Áreas de risco: um alerta na prática
Um dos locais apontados como de risco no DF pelo Plano Diretor de Orçamento Territorial do DF de 2009 é a Vila Cauhy, no Núcleo Bandeirante. A região iniciou o ano com alagamentos. Segundo a Novacap, as condições geográficas e de relevo do local dificultam o escoamento da água das chuvas. Além disso, o último relatório do Serviço Geológico Brasileiro, do ano passado, apontou Arniqueira, Fercal, Vicente Pires, Planaltina, Riacho Fundo 1, Sobradinho 2 e Sol Nascente/Pôr do Sol como áreas de risco ambiental.
“Atualmente, estamos muito focados em eventos climáticos extremos, como a recente catástrofe no Rio Grande do Sul, que trouxe à tona a preocupação com inundações. No entanto, as variações extremas podem ocorrer em qualquer circunstância, desde chuvas intensas até secas severas, frio extremo ou calor extremo. Assim, o Distrito Federal, assim como todo o planeta, está vulnerável a essas mudanças climáticas”, ressalta o professor Fabrício.
Posição da Defesa Civil e da Secretaria do Meio Ambiente e Proteção Animal do DF
Em nota enviada ao Correio, a Defesa Civil do DF frisou que os desastres são os resultados de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem, envolvendo extensivas perdas e danos humanos, materiais, econômicos ou ambientais, causando grave perturbação ao funcionamento de uma comunidade ou sociedade e excedendo a capacidade de lidar com o problema usando meios próprios.
“As obras de engenharia realizadas pelo governo, que objetivam a redução do grau de vulnerabilidade da área de risco e da população, são exemplos de ações também relacionadas à prevenção de desastres, que devem ser considerados como investimentos na área. Destacamos ainda que o controle e mapeamento de desastres faz parte da atividade orgânica e fim da Defesa Civil, bem como a formação de voluntários em Defesa Civil. Portanto, todo investimento do órgão, nos diversos níveis, compõe a estrutura utilizada para a prevenção de tais resultados adversos, que impactam a população do Distrito Federal”, detalhou o órgão.
Em 2023, a Secretaria de Segurança Pública destinou mais de R$ 3 milhões à Defesa Civil, sendo aproximadamente R$ 2,7 milhões em infraestrutura e R$ 300 mil com reforço de equipe. Para 2024 e início de 2025 estão previstos investimentos em inovação tecnológica na faixa de R$ 1,7 milhão, por meio do Fundo de Amparo à Pesquisa (FAP), além de R$ 300 mil em equipamentos.
Já a Secretaria do Meio Ambiente e Proteção Animal destacou que busca intensificar a colaboração e a integração entre os diferentes órgãos e entidades envolvidos na prevenção de desastres, por meio da inovação e do uso estratégico de tecnologias de informação. Para este ano, a pasta destinou um total de R$ 2.313.677,86 em investimentos na área de tecnologia da informação. “Esses recursos são aplicados no desenvolvimento de ferramentas e aplicações que oferecem suporte direto à Defesa Civil, ao DF-Legal e ao Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal”, disse.
Veja as emendas relacionadas ao meio ambiente pelos parlamentares da CLDF em 2024:
- Infraestrutura urbana nas cidades: Jorge Vianna (PSD), valor de R$ 500.000
- Execução de obras de urbanização em todo o DF: Robério Negreiros (PSD), valor de R$ 1.000.000,00
- Obras de urbanização na RA XXXI: Robério Negreiros (PSD), valor de R$ 400.000,00
- Execução de obras de urbanização e infraestrutura, podendo envolver drenagem pluvial, pavimentação asfáltica e ajardinamento no Setor de Mansões de Sobradinho II: Ricardo Vale (PT), valor de R$ 1.000.000,00
- Execução de obras de urbanização e infraestrutura, podendo envolver drenagem pluvial, pavimentação asfáltica e ajardinamento em Nova Colina Sobradinho II: Ricardo Vale (PT), valor de R$ 1.000.000,00
- Execução de obras de urbanização e infraestrutura no DF: Ricardo Vale (PT), valor de R$ 2.730.000,00
- Execução de obras de urbanização e infraestrutura no DF: Chico Vigilante (PT), valor de R$ 602.000,00
- Adequação ambiental de áreas rurais – instalação de sistemas simplificados de saneamento rural – Pepa (PP), valor de R$ 300.000,00
- Obras de urbanização em Ceilândia – Paula Belmonte (Cidadania), valor de R$ 170.000,00
- Obras de urbanização em prol da comunidade do DF: Eduardo Pedrosa (União), valor de R$ 420.000,00
- Construção de papa-entulhos nas cidades: Fábio Felix (Psol), valor de R$ 300.000,00
- Projetos ambientais no DF: Fábio Felix (Psol), valor de R$ 300.000,00
- Obras de urbanização no DF: Rogério Morro da Cruz (PRD), valor de R$ 1.500.000,00
- Obras de urbanização e infraestrutura em Santa Maria: Jaqueline Silva (MDB), valor de R$ 500.000,00
- Obras de infraestrutura no DF: João Cardoso (Avente), valor de R$ 600.000,00
- Obras de urbanização no DF: João Cardoso (Avante), valor de R$ 2.000.000,00
- Obras de infraestrutura nas regiões administrativas: Martins Machado (Republicanos), valor de R$600.000,00
- Apoio a projetos de meio ambiente: Rogério Morro Cruz (PRD), valor de R$ 150.000,00
- Manutenção de redes de águas pluviais: Max Maciel (Psol), valor de R$ 800.000,00
- Construção de papa-entulho no DF: Pastor Daniel de Castro (PP), valores de R$ 757.000,00 e R$385.625,00
- Instalação de papa-lixo no DF: Robério Negreiros (PSD), valor de R$ 110.000,00
- Instalação de papa-lixo no Guará: Dayse Amarilio (PSB), valor de R$ 500.000,00
- Apoio a projetos relacionados a meio ambiente e preservação: Dayse Amarilio (PSB), valor de R$ 200.000,00
- Manutenção de atividades de limpeza pública — Contêineres semi enterrados: Hermeto (MDB), valor de R$ 60.000,00
- Obras de urbanização e infraestrutura em Santa Maria: Jaqueline Silva (MDB), valor de R$ 500.000,00
- Implantação de infraestrutura rural — apoio a iniciativas de sustentabilidade: Max Maciel (Psol), valores de R$ 400.000,00, R$ 40.000,00 e R$ 560.000,00
- Implantação de redes pluviais: Eduardo Pedrosa (União), valor de R$ 100.000,00
(Dados do Sistema de Controle de Emendas Parlamentares)*
Resiliência climática
O professor Fabrício avalia que é difícil afirmar se o Distrito Federal está preparado para enfrentar possíveis catástrofes ambientais.
“Não sabemos ao certo quais tipos de desastres podem afetar nossa região. Existem possibilidades, como a ocorrência de tornados, queimadas catastróficas e aumentos expressivos de temperatura que possam causar mortes por hipertermia. Estamos expostos a tudo isso, o que torna difícil prever se estaremos preparados para as catástrofes desconhecidas, tanto em natureza quanto em momento de ocorrência”, cita.
O especialista do Ceub cita que é fundamental melhorar o planejamento da ocupação territorial e adoção de práticas sustentáveis. “Cada vez que autorizamos uma nova construção, impermeabilizamos mais o solo, reduzindo a infiltração de água e aumentando o escoamento superficial. Essa água em excesso é levada para algum lugar, sobrecarregando determinadas áreas à medida que aumentamos as zonas de ocupação humana no DF. Várias alternativas de engenharia podem ajudar significativamente a reduzir os impactos das mudanças climáticas. Além disso, é crucial uma mudança de comportamento de cada cidadão, buscando reduzir a emissão de carbono e adotando práticas mais sustentáveis”, comenta.
A coordenadora do curso de biologia da Universidade Católica de Brasília (UCB) e doutora em ecologia Morgana Bruno também ressalta que a preservação da vegetação e dos mananciais é importante para garantir a resiliência climática, ou seja, a capacidade de lidar com eventos ambientais extremos. “A resiliência está nas áreas conservadas, ter vegetação é uma forma de diminuir o impacto das chuvas. No nosso caso, temos uma sorte danada, porque a vegetação do Cerrado tem raízes profundas, o lençol freático é bem alimentado durante a época de chuva e parte da vegetação consegue se manter bem resistente na seca. É importante manter os recursos hídricos, os rios, cachoeiras e córregos”, cita Morgana, que emenda: “Ter cuidado com onde serão colocadas novas áreas de ocupação urbana, porque dependendo do local, pode ter problemas futuros, por causa da destruição de nascentes e retirada de vegetação”.