Secretaria de Trabalho pagou R$ 138 milhões em contrato com indícios de superfaturamento

Secretaria de Trabalho pagou R$ 138 milhões em contrato com indícios de superfaturamento

Cursos profissionalizantes contratados por até R$ 2,6 mil por aluno são encontrados por preço menor ou até gratuitamente no mercado

A Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Renda (Sedest-DF) fez repasses de R$ 138,2 milhões à empresa Praxis Pesquisa, Desenvolvimento e Educação, por cursos com valores superiores aos de mercado. A Praxis é a responsável pelo Qualifica-DF, programa por meio do qual a pasta oferece cursos profissionalizantes.

O custo por aluno é de R$ 2,6 mil e R$ 2,2 mil nesse contrato. No entanto, cursos semelhantes estão disponíveis no mercado por menos de R$ 1 mil ou são ofertados de forma gratuita.

O contrato foi assinado em 2022 pela sócia-diretora da Praxis, Andreia Nunes do Espírito Santo. Ela é a sócia de Godofredo Gonçalves Filho — empresário que soma, em seus negócios, mais de R$ 164 milhões provenientes de contratos com pastas do GDF (leia mais abaixo).

A coluna pesquisou quanto custaria para uma pessoa realizar alguns dos cursos que foram contratados pela pasta. Aulas de gestão de restaurantes, por exemplo, estão disponíveis gratuitamente em plataformas do Sebrae. No contrato firmado com a Praxis, o valor cotado por aluno para esse mesmo curso foi de R$ 2,2 mil.

Segundo o contrato, a empresa forneceria 200 vagas para interessados nas aulas de gestão de restaurantes. O valor total desse único curso para os cofres públicos foi de R$ 440 mil.

Já o curso de corte e costura, que dura três meses, é ofertado por empresas privadas ao custo de R$ 1.640. Porém, essa mesma qualificação também pode ser encontrada de forma gratuita no Senac-DF. No contrato firmado pela Sedest-DF, o valor desse curso foi de R$ 2,6 mil por aluno. O total de 600 vagas custou R$ 1,5 milhão ao DF. Veja:

Curso de corte e costura sai por R$ 410 mensais, com duração de 4 meses. Ou seja, valor total é de R$ 1.640 no mercado. O mesmo curso custou por R$ 2,6 mil por aluno

O curso de cabeleireiro saiu por R$ 2,2 mil, por aluno, para a Sedest-DF. No Senac-DF, o curso com 400 horas de aulas é oferecido gratuitamente.

Contrato

O contrato de prestação de serviços foi firmado com a Praxis em março de 2022, após o pregão eletrônico. O valor final estabeleceu-se em R$ 45,3 milhões. O acordo foi renovado até 2026.

A Sedest-DF pagou R$ 138,2 milhões à Praxis, de 2022 a 2024, segundo o Portal da Transparência do DF. No primeiro ano, a empresa recebeu R$ 56,6 milhões. Em 2023, o repasse chegou a R$ 59,9 milhões. E, em 2024, até o momento, a Sedest pagou R$ 21,5 milhões.

O que diz a pasta

Procurada, a secretaria informou que a Praxis é a responsável pelo programa Qualifica-DF. “Já foram capacitados mais de 50 mil alunos para o mercado de trabalho, e, no momento, há 12 mil alunos em sala de aula. Os cursos são de 240 horas-aula, no total de 40 cursos distintos.”

Questionada sobre os preços elevados, a pasta afirmou que há um processo licitatório, na modalidade de Pregão Eletrônico, que apresenta a pesquisa de preço, por isso os valores adotados não são de escolha da secretaria. No total, houve três propostas ofertadas pelas empresas Upgrade Cursos, Senac e Praxis.

Segundo a secretaria, a proposta apresentada pela Praxis ficou abaixo da média. “Vale a pena acrescentar que todo esse processo, por ser de grande porte, já foi auditado e aprovado pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF)”.

A pasta ainda explicou que o contrato engloba todos os investimentos que a empresa deverá fazer para fornecer os cursos. “O contrato engloba todos os investimentos, como locação do espaço para salas de aula, pagamento de horas-aulas e direitos trabalhistas para o corpo docente e demais funcionários, impostos, espaços para palestras e seminário, insumos para a aulas práticas, evento de formatura”, disse, em nota.

Empresa suspeita

A sócia-administradora da Praxis Pesquisa, Desenvolvimento e Educação Ltda. é Andreia Nunes do Espírito Santo. Andreia também é diretora do Instituto Capital, empresa que tem como presidente Godofredo Gonçalves Filho.

Empresas ligadas a Godofredo receberam R$ 164 milhões, em três anos, da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Renda; da Secretaria de Esporte e Lazer; e da Secretaria da Mulher do Distrito Federal.

Uma das empresas de Godofredo é a Axiomas Brasil Pesquisa, Cursos e Consultoria Ltda., alvo de tomada de contas especial do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) que aponta prejuízo de R$ 18,8 milhões aos cofres públicos em um contrato com a Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF), de 2013.

Segundo a área técnica, a Axiomas entregou uma pesquisa “muito mal elaborada” e inútil para o governo.


Geraldo Naves

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